Nascido no ano de 1930 e falecido em 2016, Ferreira Gullar é considerado um dos principais poetas brasileiros devido à sua produção inicialmente experimental e que é conhecida, principalmente, por estar relacionada ao neoconcretismo. O poema abaixo foi retirado do livro Muitas Vozes, publicado em 1999.
INFINITO SILÊNCIO
houve
(há)
um enorme silêncio
anterior ao nascimento das estrelas
antes da luz
a matéria da matéria
de onde tudo vem incessante e onde
tudo se apaga
eternamente
esse silêncio
grita sob a nossa vida
e de ponta a ponta
a atravessa
estridente
A partir da leitura desse poema, podemos perceber uma preocupação do eu-poético em refletir sobre as origens não apenas de nós, seres humanos, mas também daquilo que chamamos de vida, de modo geral.
Ferreira Gullar utiliza imagens e palavras que possuem algum tipo de contradição quando relacionadas: nos dois primeiros versos, por exemplo, o uso do verbo “haver” está no passado e depois ele se apresenta no presente; nos versos “de onde tudo vem incessante e onde / tudo se apaga”, temos a ideia de que tudo nasce e morre; na última estrofe, temos a imagem do silêncio, mas é um silêncio que grita. Por meio disso, penso que a voz-poética reflete acerca das contradições da existência, contempla-as e as coloca em evidência.
Algo que me chama atenção é o que é descrito no poema como sendo o “infinito silêncio”. Parece ser justamente a misteriosa força que move a vida e que para nós é, e continuará a ser, incompreensível. É o abismo da existência.
Mais reflexões metafísicas como essa podem ser encontradas em outros poemas de Gullar no livro Muitas Vozes. Recomendo muito a leitura da poesia desse autor que foi sensacional em vida e que continua sendo após sua morte.