De madrugada, apertam a campainha. Acordo. O som alto ainda ecoando em meus ouvidos. O coração disparado. Morreu alguém! É um fato, acho. Meu avô, meu vizinho, um primo… não sei. De uma coisa tenho certeza: sucedera alguma tragédia horrenda. Ouço minha mãe correr até a porta e abri-la. Não tinha ninguém para responder seu aflito chamado: “Aconteceu algo?”.
— Agora você já tem um lugar para ficar caso precise ir para a capital.
— Sim, obrigado pelo convite.
(Silêncio momentâneo).
— Você poderia ir até a cidade nova em que moro atualmente.
— O que farei por lá? Aquela cidade é pequena. Não há nada lá que valha a pena ser visto. Gosto da capital, de cidades grandes e de muita gente para ser vista. Cidades pequenas não me agradam.
— Tudo bem. Entendo.
(Momento da despedida).
— Boa sorte na sua nova jornada.
(Abraço apertado).
— Obrigado. Boa noite pra você. E dorme bem.
— Eu vou. Obrigado pela visita. Não some, tá?
— Eu não vou.
O seu cheiro ficou comigo mesmo após sua partida, e é incrível como, sem percebermos, determinadas pessoas ficam nas nossas memórias e, por meio de suas companhias, pouco a pouco vamos sentindo aquele sentimento especial desabrochar no peito, aquela ânsia para vermos a pessoa por quem o nosso coração se aquece; não é para ser esquecido uma coisa como essa, acho que nunca esquecemos a sensação, apenas seguimos em frente e deixamos que outras pessoas possam fazer a planta florescer novamente; agora que não é mais possível desfrutar do sentimento, torná-lo concreto com o ápice dos gestos físicos, me resta aquilo que foi deixado para trás; o seu cheiro ficou comigo mesmo após a sua partida.
— Ando cansado. Hoje estou cansado. Acho que estou cansado da vida, sabe? Mas também estou cansado de ficar cansado. Essa inconstância às vezes me mata a paciência. Não valemos nada nessa vida. Somos poeira estelar. Quem disse isso, mesmo? Eu não lembro. Decoro as frases, versos de poemas que leio, leio, leio sem parar, mas não guardo os nomes das mãos santas que puseram aquilo que acalenta o nosso coração em meio à indiferença humana. Posso te dar vários exemplos da minha capacidade de decoração, não que seja grande coisa ter memória boa. Você demora mais pra esquecer. Sou rancoroso? Não sei. Estou apenas falando aqui e acho que devo parar por já ter falado demais. Mas é difícil suportar a saudade de quem a gente ama e que a vida tratou de levar embora, não é? Sentimento esquisito esse, essa tal de saudade.
“(…) sem percebermos, determinadas pessoas ficam nas nossas memórias e, por meio de suas companhias, pouco a pouco vamos sentindo aquele sentimento especial desabrochar no peito, aquela ânsia para vermos a pessoa por quem o nosso coração se aquece” Lindo!
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Obrigado 🙂
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